Complexidade e multifatorialidade na etiologia do TEA: uma análise integrativa
O Transtorno do Espectro Autista (TEA) é um distúrbio neurodesenvolvimental caracterizado por uma capacidade reduzida de interação social, deficiências na comunicação verbal e não verbal, déficits na reciprocidade social e comportamentos comunicativos essenciais para compreender, interagir e manter relacionamentos. O autismo também envolve inflexibilidade comportamental, comportamentos repetitivos e interesses restritos, com dificuldades em entender as intenções e pensamentos dos outros.
Frequentemente, o TEA está associado a outros distúrbios neurodesenvolvimentais e condições médicas ou psiquiátricas, como Deficiência Intelectual, Transtornos da Linguagem, Disfunções Sensoriais, Epilepsia, Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), problemas gastrointestinais, ansiedade, depressão, transtornos de humor, Transtornos Obsessivos Compulsivos (TOC), Danos Cerebrais Invisíveis e distúrbios do sono.
A etiologia do TEA está associada à interação de fatores genéticos e ambientais, mas ainda sem uma clara patogenia identificada ou marcadores diagnósticos específicos. Neste artigo, vamos discorrer melhor sobre cada uma das possíveis causas, de forma a elucidar melhor tudo isso!
Fatores Genéticos
O autismo é caracterizado por uma alta herdabilidade, com estudos indicando uma taxa de concordância de até 98% entre gêmeos monozigóticos e de 40 a 60% entre dizigóticos. Irmãos mais novos de pessoas com autismo têm um risco significativamente maior de desenvolver o transtorno, especialmente se forem do sexo masculino.
Entre 20 a 25% dos indivíduos com autismo, é possível identificar causas genéticas específicas, incluindo mutações de novo, variações genéticas raras e comuns, e polimorfismos associados ao TEA. Estas variações se dividem em sindrômicas, que apresentam fenótipos específicos e estão relacionadas a alterações cromossômicas como na Esclerose Tuberosa, e não sindrômicas, que não têm fenótipos orientadores claros.
Indivíduos com mutações de novo tendem a apresentar maior gravidade clínica e déficits intelectuais mais acentuados. A expressão de certos genes pode ser influenciada por hormônios, contribuindo para a maior prevalência do autismo em homens em comparação às mulheres.
A consulta genética é essencial para identificar essas variações genéticas e fornecer o aconselhamento genético adequado, destacando a complexidade e a necessidade de uma abordagem personalizada na avaliação genética do autismo.
Fatores Epigenéticos
O desenvolvimento humano é um processo altamente coordenado, especialmente no cérebro, e é sensível a influências ambientais que podem impactar a arquitetura do sistema nervoso central. A epigenética foca em mudanças na atividade dos genes que ocorrem sem alterar a sequência de DNA. Estas mudanças podem ser influenciadas por fatores ambientais ou de estilo de vida.
Os principais processos epigenéticos incluem:
– Reprogramação Epigenética: Mudanças persistentes na função celular em resposta a estímulos ambientais precoces, que podem levar ao desenvolvimento de patologias mesmo após o estímulo inicial desaparecer.
– Herança Epigenética Transgeracional: Memória de estímulos ambientais que persiste e é transmitida através das gerações, mesmo na ausência do estímulo original.
Esses processos destacam a importância dos fatores ambientais na regulação da expressão genética e no desenvolvimento de condições como o TEA.
Fatores Neuropatológicos
Foram relatadas anomalias como o aumento da circunferência da cabeça e do volume intracraniano em crianças de 1 a 4 anos de idade, que posteriormente foram diagnosticadas com TEA (Transtorno do Espectro Autista). Medições volumétricas cerebrais de jovens com TEA mostraram alterações no lóbulo occipital, na região pericentral, no lóbulo temporal medial, nos gânglios basais e na zona proximal ao opérculo parietal direito. Portanto, observou-se que um crescimento precoce no TEA é seguido por uma fase de estagnação durante o desenvolvimento ou até mesmo de degeneração.
Muitos genes associados a um alto risco de TEA codificam proteínas cruciais para a função sináptica do cérebro. Eles incluem genes que codificam proteínas da família de adesão celular de neurexinas (NRXN1) e neuroliginas (NLGN2, NLGN4X).
Estudos in vitro e in vivo mostram que os genes associados ao TEA estão envolvidos em vias responsáveis pela síntese e degradação de proteínas, remodelação da cromatina e função sináptica, participando da homeostasia e da plasticidade sináptica. Assim, o TEA também pode ser considerado uma sinaptopatia, onde existem vias de sinalização críticas, como a via mTOR/PI3K, particularmente associada ao TEA sindrômico.
Idade Materna e Paterna
A idade dos pais é considerada um fator de risco para o desenvolvimento do Transtorno do Espectro Autista (TEA). Mães com menos de 20 anos apresentam um risco menor em comparação com aquelas entre 25 e 29 anos, e esse risco aumenta ainda mais em mães com mais de 35 anos. Quanto à idade paterna, o risco começa a aumentar a partir dos 30 anos, e homens com mais de 55 anos têm o dobro do risco em relação aos mais jovens.
Essa correlação é suportada pela hipótese de que mutações de novo nas células germinais, que podem se tornar mais frequentes com o envelhecimento, contribuem para o desenvolvimento do TEA. Embora a associação com a idade materna necessite de mais estudos, já foram relatadas mudanças cromossômicas e modificações genômicas relacionadas à idade das mães.
Fatores Infecciosos e Gestacionais
A gravidez torna a mulher mais vulnerável a processos inflamatórios que podem afetar o desenvolvimento dos seus descendentes, especialmente quando ocorrem no início da gravidez. Há uma associação bem conhecida com fatores genéticos, mas estudos também ressaltam a influência de fatores ambientais, particularmente perinatais, como elementos significativos associados a essa patologia.
Entre esses fatores, infecções virais durante o primeiro trimestre da gravidez são consistentemente sugeridas como contribuintes para o aumento dos casos de autismo nos descendentes. Infecções como varicela, sarampo, rubéola, caxumba, pneumonia, sífilis, herpes e citomegalovírus são destacadas; sendo este último conhecido por causar danos neurológicos graves em até 20% dos nascidos de gestantes infectadas.
Estudos em modelos animais mostram que as infecções maternas ativam o sistema imunológico e levam à detecção de citocinas inflamatórias e anticorpos anti-cerebrais no plasma, encontrados em até 10% das mães de crianças com TEA. Esses fatores podem alterar a arquitetura cerebral, causando as mudanças no desenvolvimento e comportamentos típicos do TEA.
Fatores Ambientais
Exposições ambientais, incluindo exposição a poluentes como metais pesados (zinco), pesticidas e poluentes do ar, ou ainda exposição abusiva a telas, têm sido estudadas como possíveis contribuintes para potencializar os fatores genéticos de TEA. A exposição precoce durante o desenvolvimento fetal ou nos primeiros anos de vida, quando o cérebro está em rápida formação e mais vulnerável, é particularmente crítica.
Concluindo…
A interação desses diversos fatores etiológicos no TEA sugere que a abordagem para entender e tratar este transtorno complexo deve ser igualmente multidimensional, enfatizando a necessidade de uma perspectiva ampla e integrativa.
A medicina integrativa se apresenta como uma abordagem holística essencial na avaliação e no tratamento do Transtorno do Espectro Autista (TEA), pois considera a complexidade multifatorial da condição. Essa abordagem não apenas focaliza os sintomas manifestos, mas também busca identificar e tratar as causas subjacentes, integrando diferentes modalidades terapêuticas.
Ao incluir práticas de diversas disciplinas médicas e terapêuticas, a medicina integrativa procura entender o impacto dos fatores genéticos, ambientais, epigenéticos e de estilo de vida, fornecendo um plano de tratamento personalizado e abrangente. Além disso, essa perspectiva holística envolve a cooperação entre diferentes profissionais de saúde, incluindo médicos, nutricionistas, terapeutas ocupacionais, psicólogos e fonoaudiólogos, para garantir um suporte integral ao paciente e sua família, maximizando assim as chances de uma melhor qualidade de vida e desenvolvimento do indivíduo com TEA.
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